O Evangelho quer produzir em nós uma esperança que supera os limites
do otimismo, pois antes de tudo a nossa esperança nos enraíza e nos
remete a Deus, e não em pensamentos positivos do tipo: “No fim dará tudo
certo!” Será? Dependerá de respostas acertadas, inspiradas,
evangélicas!
O evangelista apresenta a Palavra do Senhor em seu sermão
escatológico (Lc 17,26-37), no qual Jesus utiliza dois antigos
acontecimentos para ensinar algo urgente para o presente e o futuro.
Cristo cita Noé (cf. Gn 6,5) e Ló (cf. Gn 19,19-26), pois no tempo de
ambos: «comiam, bebiam, casavam-se e se davam em casamento… compravam e vendiam, plantavam e construíam» (Lc 17,27s).
Isto é o mesmo que dizer que eles viviam todos num nível apenas
horizontal da vida, no comum dos mortais! Então Jesus utiliza expressões
surpreendentes e que revelam uma intervenção decisiva de Deus na
história passada: «até o dia em que Noé entrou na arca… Mas no dia em que Ló saiu de Sodoma» (vv. 27.29).
Para revelar que o mesmo Senhor da história um dia intervirá definitivamente, disse Jesus Cristo: «O mesmo acontecerá no dia em que o Filho do Homem for revelado» (v.30).
Jesus não “joga com palavras” e nem o evangelista, mas tudo isto é
para que nos deixemos conquistar pela ação do Espírito de Cristo atuante
na história presente da humanidade. Ele, antes de tudo e todos,
pretende preparar os amados de Deus para o Juízo Final, o qual não
tarda: «Eis que venho em breve, trazendo comigo a minha recompensa,
para retribuir a cada um segundo as suas obras. Eu sou o Alfa e o Ômega,
o Primeiro e o Último, o Começo e o Fim» (Ap 22,12-13).
Mas retornando um pouco atrás, nota-se que os personagens citados por
Jesus, também nos recordam a realidade dos seus contemporâneos: «O
Senhor viu o quanto havia crescido a maldade das pessoas na terra e como
todos os projetos de seus corações tendiam unicamente para o mal» (Gn 6,5). Quanto a Sodoma, o diagnóstico não foi também muito animador para os Anjos do Senhor, perante o justo Ló: «Vamos destruir este lugar, pois grande é o clamor contra ele diante do Senhor» (Gn 19,13).
Passagens bíblicas que não nos dão o direito de julgar e condenar
ninguém, tampouco querem gerar pessimismo em nós, mas podem nos chamar à
interpretação dos sinais – ou contra-sinais! – dos tempos atuais,
cristãos radicados na misericórdia e verdade do Senhor.
Ele virá! Maranathá! Ainda que os acontecimentos e notícias que
chegam a nós não parecem compor um cenário tão diferente ao de Noé ou de
Ló, não poderemos nunca datar ou precisar a volta gloriosa d’Aquele que
não cessa de vir ao nosso encontro em cada situação da vida, sem nunca
deixar de também chamar: «Vinde a mim, todos vós que estais cansados e carregados de fardos, e eu vos darei descanso» (Mt 11,28).
Por isso também, precisamos aproveitar este Kairós (tempo de graça),
que o nosso Papa Bento XVI inaugurou, com o Ano da Fé. Nele podemos
lembrar que se Noé entrou com a sua família na Arca e Ló saiu
de Sodoma com os seus familiares, precisamos assumir a nossa casa e os
relacionamentos familiares como o primeiro campo de missão, onde é
necessário anunciar o Senhor.
Ele quer contar conosco na salvação dos nossos e outros, a começar
pela intercessão. Somente em Jesus todos podem crescer no “entrar e
sair”, como expressão da verdadeira liberdade no Senhor, a qual nunca
significará um render-se aos modismos ou ideologias mundanas: «Eu sou a porta. Quem entrar por mim será salvo; poderá entrar e sair e encontrará pastagem» (Jo 10,9).
Ele é o Bom Pastor que, através da sua Igreja-Esposa, quer salvar e
preparar a humanidade para a sua Segunda Vinda. Esta última não pode ser
temida, mas profundamente suplicada e acolhida: «O Espírito e a
Esposa dizem: “Vem”! Aquele que ouve também diga: “Vem”! Quem tem sede,
venha, e quem quiser, receba de graça a água vivificante» (Ap 22,17).
Eis a esperança que pode transformar o mundo atual em lugar não de medo, mas de fé, esperança e amor operantes.
Padre Fernando Santamaria – Comunidade Canção Nova
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